A licença paternidade e a Medida Provisória 936

Foto por Pixabay em Pexels.com

Como fica a licença paternidade para os papais que possuem os contratos de trabalhos suspensos ou ainda, sob os efeitos da redução salarial e redução de jornada de trabalho pelos termos da MP936?

Em um outro momento, compartilhei a análise dos efeitos da suspensão do contrato de trabalho prevista na medida provisória 936 aos contratos de trabalho de trabalhadoras gestantes, inclusive com sugestão de modelo de termo de acordo.

Dentre os diversos comentários que teve (aos quais sou imensamente agradecida! 🙂 ) um me chamou muito atenção e agradeço ao Marco Bueno pelo seu questionamento. Este texto é dedicado à você e aos demais futuros papais que possam estar nesta mesma situação.

Olá Dr Ana, parabéns pelo artigo. Está bastante esclarecedor!

Gostaria de tirar uma dúvida com relação à licença paternidade. Meus filhos nascerão em Maio e tenho direito aos 20 dias de licença.

Terei a redução de salário a partir de 01/05 mas não sei qual seria o valor correto que eu deveria receber. Eu achava que receberia integralmente os dias referentes a licença e a redução seria aplicada somente aos dias restantes do mês. Entretanto, o RH indicou que terei a redução aplicada ao salário total, sem considerar a licença. Estranhei esse racional uma vez que a MP fala de redução de salário vinculada a redução de jornada mas como falar em redução de jornada durante a licença? Está correto isto? Como deveria ser minha remuneração em Maio? Obrigado pela ajuda e mais uma vez parabéns!

Marco Aurelio

Antes de responder os efeitos da Medida provisória, é preciso entender o que é a licença paternidade e suas características.

A LICENÇA PATERNIDADE

A licença paternidade é um direito constitucional concedido aos homens em decorrência do nascimento, adoção ou guarda de uma criança/adolescente.

Sua previsão legal é no artigo 7o da Constituição Federal:

Artigo 7º CF: “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

…..

XIX – licença-paternidade, nos termos fixados em lei;”

Acompanhados pelo artigo 10 do ADCT:

Artigo 10 ADCT:  “Até que seja promulgada a Lei Complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição:

……

§ 1º – Até que a lei venha a disciplinar o disposto no art. 7º, XIX, da Constituição, o prazo da licença-paternidade a que se refere o inciso é de cinco dias.”

A regra geral é de 5 (cinco) dias. Para os funcionários públicos, a regra geral é de 20 (vinte) dias.

Todavia, é possível prorrogar o prazo de 5 (cinco) dias, nos casos das empresas vinculadas ao programa cidadã. Para os trabalhadores homens das empresas cidadãs a licença paternidade é de 20 (vinte) dias.

NATUREZA JURÍDICA DA LICENÇA PATERNIDADE

A licença paternidade é um direito constitucional vinculado aos direitos e garantias sociais, previsto no artigo 7 da Constituição Federal.

Sua existência se justifica para permitir que o pai esteja ao lado da mãe nos dias subsequentes ao nascimento do bebê, tanto como apoio à mãe como também para que ele possa aproveitar e firmar o vínculo paterno formando quando do ventre.

Como apresenta Dioclécio que propõe a ampliação da licença paternidade para 30 dias, é “o direito de estar presente, de participar desse momento decisivo, de permitir à criança a identificação com sua figura e assegurar dessa maneira a construção de um vínculo afetivo amplo”

A paternidade ativa, ao contrário do que acontece com a maternidade, ela acontece com o nascimento do bebê. Por isso é tão importante a existência da licença paternidade.

Pelo fato de ser uma garantia social, acaba por estar vinculada às relações de trabalho. Logo, é um direito trabalhista do homem à licença paternidade.

Assim, a licença paternidade é uma licença remunerada. Um afastamento justificado do empregado do trabalho sem prejuízo ao salário. 

Logo, trata-se de uma interrupção ao contrato de trabalho.  

Como defende Amador Paes de Almeida: “Caracteriza-se a interrupção pela simples paralisação dos serviços; o empregado não presta serviços, mas o empregador paga seus salários; e o período de interrupção é computado no tempo de serviço”. (ALMEIDA, Amador Paes de. CLT Comentada. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.1167.)

QUANDO SE INICIA A LICENÇA PATERNIDADE

Diferentemente da licença maternidade que pode iniciar até 28 dias antes do parto, a licença paternidade inicia no dia útil seguinte a data do nascimento da criança. Então, caso a criança nasça na sexta-feira, iniciar-se-á a licença na segunda feira (lembrando que feriado não é dia útil).

O PAGAMENTO DA LICENÇA PATERNIDADE É FEITO PELO INSS COMO O SALÁRIO MATERNIDADE (E INTERMEDIADO PELO EMPREGADOR)?

A licença paternidade é um direito trabalhista e não previdenciário, de natureza salarial  (ônus da empresa) e não de benefício previdenciário.

Vale destacar que há um movimento para igualar homens e mulheres quanto ao salário maternidade e paternidade, no sentido deste também ser pago pelo INSS. Mas enquanto a alteração não vem, o pagamento pelos 5 ou 20 dias será a cargo da empregadora e, não, do INSS.

Lembrando que o nome do benefício previdenciário destinado às mulheres (e na sua falta aos homens) pelo nascimento da criança é salário maternidade e não licença maternidade.

Elucidadas estas características, como fica a licença paternidade para os homens trabalhadores que estão com seus contratos de trabalhos sob efeitos da MP936?

Destaca-se que, o que aqui se apresenta é aplicável apenas para os casos em que o nascimento do bebê ocorre dentro do período abrangido pela suspensão do contrato de trabalho ou efeitos da redução salarial/jornada de trabalho. Nem antes, nem depois.

A LICENÇA PATERNIDADE E A SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO PELA MP936

Como fica a licença paternidade caso o bebê nasça dentro do período de suspensão do contrato de trabalho fundamentado pela MP936? 

Da mesma forma que aplicado à licença maternidade, não é possível interromper a suspensão, pelo simples fato do contrato de trabalho não estar ativo. 

Só é possível interromper o que está ativo. E, o contrato suspenso não está ativo.

Assim, em havendo o nascimento durante o período de suspensão do contrato de trabalho, a licença paternidade deve ser gozada após o encerramento da suspensão do contrato de trabalho, a iniciar no dia útil subsequente ao término da suspensão do contrato de trabalho.

Esse raciocínio decorre de analogia ao entendimento dos casos em que o parto antecede ou acontece do parto durante as férias do trabalhador pai.

No caso, “quando o nascimento ocorrer no dia anterior ao do início das férias, o período de férias deve ser adiado para o dia seguinte ao do término da licença-paternidade, sob pena de se configurar a supressão dos direitos de auxiliar a esposa, providenciar o registro civil do filho e conviver com o recém-nascido em licença-paternidade” (Processo nº 0001987-47.2012.5.10.002). 

Assim sendo, o pagamento dos dias referente a licença paternidade, uma vez que gozadas após o encerramento da suspensão, logo com o contrato reativado, deve ter como base o salário pago anteriormente à suspensão.

A LICENÇA PARTERNIDADE E A REDUÇÃO DE JORNADA E SALÁRIO PELA MP936

Como fica o pagamento dos dias da licença paternidade caso o bebê nasça durante o período de abrangência do acordo individual? Deve ser pago a redução ou o salário normal?

A medida provisória em nada dispõe.

Não encontramos jurisprudência sobre o assunto por ser novidade. Afinal, é um caso atípico. Nunca, no sistema jurídico, houve um caso parecido.

Até que venha alguma posição doutrinária ou dos tribunais, cabe opinião. Resta registrado que aqui, é posição (aberta ao debate).

Estamos vivenciado “tempos de guerra” e que demanda a adoção de bom senso em todas as decisões.

Neste caso, ao contrário da suspensão, o contrato está ativo. Razão pela qual implica no gozo da licença tão logo ocorra o nascimento, dentro do prazo abrangido pelo acordo individual de redução de jornada de trabalho e salário.

Neste sentido, o empregado receberá (ainda que a menor que o seu salário normal) valores sem estar trabalhando, afinal trata-se de uma interrupção de um contrato de trabalho ativo, porém, com jornada e salário reduzidos.

A princípio, devidamente legal. E, de certa forma, benéfico se comparado aos demais trabalhadores que acordaram as mesmas regras.

Esta constatação me leva a outro questionamento: 

seria justo ao empregado ter, bem neste momento do nascimento do seu bebê, momento em que precisa de segurança financeira, ter acordado a redução de jornada de trabalho e salário sendo que ele terá 20 dias do seu contrato interrompido, ou seja, que não trará o retorno esperado à empresa (razão que implica na escolha pela redução de jornada de trabalho) pelo fato e não trabalhar durante 20 dias? 

Será que não haveria, dentre as medidas possibilitadas pela MP927 e MP936 outra que atenda ao seu direito à paternidade de 20 dias e ao mesmo tempo os interesses do empregador?

A exemplos:

  1. Não seria mais interessante, ao empregador, aplicar para estes empregados (próximos futuros papais) as outras medidas, como gozo de férias, ou ainda, antecipar as férias nem adquiridas (o que a MP927 autoriza)?

ou

2) Será que não seria mais interessante considerar, para o casos de licença paternidade de 20 dias, a suspensão do contrato de trabalho (pois quem sabe possa mais benéfico ao trabalhador financeiramente e à empresa que terá uma “folga econômica”), a iniciar após o término do contrato de trabalho?

Certo que, para tanto é preciso levar em consideração o salário percebido pelo empregado e as regras a ele aplicáveis pela MP936. Afinal, cada caso é um caso. Não se pode generalizar. Cabe conversar com o RH e o Contador para tentar achar a justa e melhor medida. 

Lembrando que a MP936 leva em consideração:

a)co valor percebível referente ao seguro desemprego com possibilidade de co-participação da empresa no pagamento feito pela União (70/30) nos casos de suspensão do contrato de trabalho. Já no caso de redução salarial, aplica-se sobre a base de cálculo o percentual da redução (25%, 50% ou 70%).

b) é destinada principalmente aos trabalhadores com salário igual ou inferior a R$ 3.135,00 (três mil cento e trinta e cinco reais) ou aos portadores de diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

Ao Marco, só me resta dizer, neste momento, que sim, o RH não está em desacordo com a legislação atual em sua posição. Pelo fato de se interromper um contrato ativo, nesta interrupção deve-se ser aplicada às regras do momento, ainda que aparentemente, prejudiciais ao empregado. 

Por outro lado, acredito que seria interessante conversar com o RH sobre o assunto e compará-las com as demais medidas permitidas a serem adotadas neste momento do Covid-19.

Lembrando que trata-se de acordo individual de trabalho (aplicável aos casos de redução de jornada de trabalho e de salário de vinte e cinco por cento, acima deste percentual é preciso que seja por negociação coletiva) e a negociação deve estar aberta sempre, nunca imposta.

Gratidão pela contribuição. Desejo a você e sua família muita saúde.

Publicado originalmente no site jusbrasil: https://anacrisbaruffi.jusbrasil.com.br/artigos/838425842/a-licenca-paternidade-e-a-medida-provisoria-936

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